terça-feira, 21 de abril de 2009

O tempo das tribos: o declínio do individualismo nas sociedades pós-modernas

Mesmo diante de tanta desumanização que cerca o mundo atualmente, ainda há teias de solidariedade. Cada vez mais fechadas, mais restritas a seus grupos, mas elas existem. Até mesmo porque, conforme as épocas, predomina-se um tipo de sensibilidade, um tipo de estilo destinado a especificar as relações que se estabelecem entre as pessoas. É essa questão que o autor de “O tempo das tribos: o declínio do individualismo nas sociedades pós-modernas”, Michel Maffesoli, tenta nos mostrar no capítulo IV: O tribalismo.
O autor fala da passagem da “polis ao thiase” ou da passagem da ordem política à ordem da fusão. A ordem política privilegia os indivíduos e suas associações contratuais e racionais, que tem uma consistência própria, uma finalidade, já a ordem de fusão acentua a dimensão afetiva e sensível das associações. Essa ligação entre as massas não precisa ser através de um contato constante ou freqüente, ela vai se dando através de pequenas afinidades, de elementos em comum entre pessoas que vão cristalizando grupos massificados, o que Maffesoli chama de relação táctil.
As mensagens de computador, as redes sexuais, as diversas solidariedades, os encontros esportivos e musicais são todos indícios de um ethos em formação. E isso que delimita esse novo espírito do tempo que podemos chamar de socialidade, onde a pessoa representa papéis, tanto dentro de sua atividade profissional quanto no seio das diversas tribos de que participa. Mudando o seu figurino, ela vai, de acordo com seus gostos – sexuais, culturais, religiosos - assumir o seu lugar. O que podemos observar é que a partir dos costumes, dos desejos individuais que as pessoas vão escolhendo a que grupo irão pertencer.
O solidarismo, os encontros esportivos ou as religiões são momentos em que as pessoas começam suas relações tribais. A preocupação em estar de acordo com o grupo, de ser o mais plenamente aceito possível, faz através da massificação os reagrupamentos sociais, ou seja, está diminuindo a individualização social. Watzlawick falava do “desejo ardente e inabalável de estar de acordo com o grupo”. Essa massificação causa um certo conformismo diante do que o grupo entende por certo, e o que deveria ser uma opinião individual acaba sendo uma opinião coletiva. O autor se refere a isso como a nebulosa “afetual”, que permite compreender a forma específica que a socialidade assume nos dias atuais: o vaivém massas-tribos. Ao contrário da estabilidade induzida pelo tribalismo clássico, o neotribalismo é caracterizado pela fluidez, pela liberdade de poder trocar de grupos conforme as vontades próprias.
Essa anulação diante do grupo é muito bem ilustrada pelo autor no trecho “a teatralidade instaura e reafirma a comunidade. O culto do corpo, os jogos de aparência só valem porque se inscrevem em uma cena ampla, onde cada um é, ao mesmo tempo, ator e espectador”.
A sociedade vive e se organiza através das experiências vividas em seus grupos, que se entrecruzam e proporcionam outras experiências e situações, o que ao mesmo tempo que massifica, diferencia através de polaridades muito diversificadas.
A pós-modernidade tende a favorecer, nas megalópoles contemporâneas, ao mesmo tempo o recolhimento no próprio grupo e um aprofundamento das relações no interior desses grupos, dando a oportunidade de surgir uma multiplicidade de estilos, um multiculturalismo, onde de maneira conflitual e harmoniosa ao mesmo tempo esses estilos de vida se põem e se opõem uns aos outros. Mas existe algo de comum entre esses grupos, uma característica específica da pós-modernidade: a preocupação com o aqui e o agora, isso contribui para que as relações sejam mais intensas e vividas no presente.
Outra característica da massa moderna é o que o autor coloca como a lei do segredo. Esse é um mecanismo utilizado pelos grupos como forma de proteção em face ao exterior, isto é, em face das formas superimpostas de poder, essa é uma maneira encontrada para fortalecer o grupo. Essa sociedade secreta leva a um fechamento dos grupos, todavia, permite a sua resistência. O fato de partilhar um hábito, uma ideologia, um ideal, determina o estar-junto, e permite que este seja uma proteção contra a imposição. A união dentro dos microgrupos existe, senão, para fortalecê-los contra o grande grupo.
O tribalismo, microgrupos formadores da socialidade, sob seus aspectos mais ou menos reluzentes, está impregnando cada vez mais os modos de vida, ou seja, através de bandos, gangs, grupos ele recorda a importância do afeto na vida social. Trata-se de uma “reconsideração do conjunto das regras de solidariedades”.

Fernanda Assmann e Talita Orsolin

1 comentário:

  1. Tenho de concordar com o fato de o grupo a que pertencemos, muitas vezes, "abafar" alguns de nossos pensamentos -
    nos moldamos externamente para agradar, ou não ser excluído. Entretanto, não acredito que esta mudança também
    aconteça sempre internamente; temos princípios, idéias, preferências intrínsecas a nossa educação e formação pessoal,
    portanto,ao meu ver, não é um grupo de amigos que vai mudar certos valores de caráter. Além disso, vejo essa
    influência que um grupo pode vir a causar sobre uma pessoa algumas vezes até positiva - somos seres em constante
    evolução e construção, não somos donos da verdade, portanto, ouvir opiniões diferentes de pessoas nas quais
    temos credibilidade é uma forma de crescer, aprender, etc.

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